Está a ser anunciada (num anúncio fraudulento já denunciado ao facebook) uma suposta lista de bens da herança da escritora que inclui um “investimento em criptomoedas”. A “notícia” usa o grafismo do Sapo e é, obviamente, falsa.

O código da página do “investimento” é típico de uma operação profissional de fraude financeira online, não é uma página “artesanal” nem improvisada. Indica claramente que estamos perante uma infra-estrutura de scam organizada, automatizada e recorrente, que reutiliza figuras públicas portuguesas para ganhar credibilidade, neste caso explorando a morte de Clara Pinto Correia.

O primeiro sinal óbvio é que a página não é um site informativo, nem jornalístico. É uma landing page de conversão. Todo o HTML, JavaScript e variáveis globais estão orientados para um único objetivo: levar o utilizador a preencher um formulário e entregar dados pessoais e contacto telefónico. Não existe qualquer conteúdo real de investimento, apenas narrativa fabricada.

O nome “Vista Montorix” é irrelevante. Trata-se de um nome descartável, usado apenas como rótulo comercial. Amanhã será outro. O código mostra que o mesmo modelo é reutilizado em campanhas diferentes, mudando apenas o “personagem” e o país. Isto vê-se pela estrutura multilingue preparada de raiz, apesar da campanha estar focada em Portugal.

O valor fixo de 250 euros definido logo no JavaScript não é inocente. É um valor psicológico clássico em burlas de investimento, suficientemente baixo para parecer acessível e suficientemente alto para justificar contacto posterior por “consultores”. Não é um investimento, é um filtro de vítimas.

A presença massiva de variáveis de tracking mostra que o operador segue o utilizador ao segundo. Tempo na página, scroll, localização aproximada, dispositivo, IP, operador de telecomunicações, browser, tudo é recolhido. Isto não é para melhorar a experiência do utilizador, é para avaliar a probabilidade de a vítima cair na burla e priorizar contactos.

O sistema “aioBus” e os identificadores de campanha indicam o uso de uma plataforma profissional de affiliate fraud, usada internacionalmente para scams financeiros. Isto inclui cloaking, ou seja, a capacidade de mostrar uma página “limpa” a moderadores ou jornalistas e uma página fraudulenta ao público-alvo. Não estamos perante um site isolado, mas sim uma rede.

O detalhe mais grave é a referência explícita à campanha “PT Clara Pinto Correia legacy”. Isto prova que o uso do nome e da morte da escritora não é acidental nem gerado por terceiros, mas sim uma decisão consciente de marketing fraudulento. A figura pública serve apenas como isco emocional, explorando confiança, choque e curiosidade.

O formulário pede nome, email e telefone, com regras que excluem emails locais. Isto é deliberado. Querem contactos “limpos” para venda a call centers de burla, muitas vezes fora da UE. A partir desse momento, o controlo deixa de estar no site e passa para chamadas persistentes, pressão psicológica e pedidos sucessivos de dinheiro.

Em termos claros e sem rodeios: este código indica uma burla financeira organizada, transnacional, baseada em engenharia social, exploração de figuras públicas e recolha massiva de dados pessoais, com possível violação do RGPD, do DSA e da lei penal portuguesa.

Não há investimento. Não há plataforma. Não há herança. Há apenas um funil bem oleado para roubar dinheiro e dados.

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