A desinformação constitui uma ameaça real e crescente à qualidade da democracia portuguesa, à confiança nas instituições e à integridade do debate público. Apesar da existência da Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital (Lei n.º 27/2021) e da sua simplificação em 2022 (Lei n.º 15/2022), bem como de medidas pontuais como o Sistema de Resposta Rápida durante períodos eleitorais, o quadro jurídico e institucional em vigor permanece insuficiente para uma resposta sistémica e eficaz.
O recente relatório do Observatório Europeu dos Media Digitais (EDMO), divulgado em junho de 2025, identifica Portugal como um dos países com menor densidade legislativa em matéria de combate à desinformação, ainda que destaque o dinamismo das iniciativas de literacia mediática. O mesmo relatório salienta o papel ativo de atores políticos radicais na disseminação de desinformação, com impactos nocivos na confiança social, no crescimento de fraudes digitais e no enfraquecimento da coesão democrática.
(a este propósito ver:
https://cidadaospelaciberseguranca.com/2024/12/18/manipulacao-eleitoral-no-tiktok-riscos-para-a-democracia-e-desafios-na-era-digital/)
Perante esta realidade, a CpC: Iniciativa Cidadãos pela Cibersegurança acredite que urge adotar uma abordagem nacional integrada, que combine regulação, prevenção, responsabilização e capacitação cívica.
A proposta que apresentaremos complementa a legislação existente, nomeadamente com:
A Carta dos Direitos na Era Digital
https://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/Cultura_DireitoAutor_Carta-Portuguesa-Direitos-Humanos-Era-Digital.asp
A Lei n.º 15/2022 (simplificação da proteção contra desinformação)
https://www.sgeconomia.gov.pt/destaques/lei-n-152022-simplifica-o-regime-de-protecao-contra-a-desinformacao-e-assegura-a-sua-articulacao-com-o-plano-europeu-de-acao-contra-a-desinformacao-span-classnovo-novospan.aspx
O Código de Conduta da UE para a Desinformação (transposto via DSA)
https://digital-strategy.ec.europa.eu/en/library/guidance-strengthening-code-practice-disinformation e
O Sistema de Resposta Rápida, de caráter temporário, aplicado a ciclos eleitorais.
https://rr.pt/noticia/politica/2025/04/24/pela-1-vez-portugal-vai-ter-sistema-de-resposta-rapida-para-denunciar-desinformacao/422771/
Propostas CpC:
1. Criação de um Regime Jurídico de Prevenção e Combate à Desinformação com:
a) definição legal clara de desinformação intencional, distinguindo-a de liberdade de expressão.
b) Estabelecimento de mecanismos sancionatórios proporcionais para quem, com dolo, promova ou financie campanhas de desinformação com impacto político ou social.
c) Possibilidade de bloquear campanhas digitais comprovadamente falsas com base em decisão fundamentada da ERC ou tribunal administrativo.
2. Reforço da Autoridade da ERC:
a) Alargamento das competências da Entidade Reguladora para a Comunicação Social no domínio digital, com:
b) Capacidade de auditar conteúdos digitais patrocinados.
c) Imposição de medidas corretivas às plataformas digitais.
d) Publicação semestral de um relatório de monitorização da desinformação.
3. Criação de um Observatório Nacional Contra a Desinformação:
a) Entidade independente com orçamento próprio, supervisionada pela Assembleia da República, responsável por:
b) Monitorizar tendências de desinformação.
c) Avaliar riscos e impactos eleitorais.
d) Articular-se com EDMO e outras estruturas europeias.
e) Apoiar financeiramente investigações académicas, trabalhos jornalísticos (via concurso) e relatórios públicos.
4. Institucionalização da Literacia Mediática nas Escolas:
a) Introdução obrigatória de um módulo anual de literacia mediática e digital crítica nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e no ensino secundário.
b) Criação de um programa nacional de formação contínua para professores nestas áreas, com acreditação.
5. Estabilização do Apoio ao Fact-checking:
a) Criação de um fundo anual, gerido por concurso público transparente, para apoiar entidades jornalísticas independentes com atividade regular de verificação de factos, garantindo assim a independência editorial com critérios de rigor e transparência assim como a obrigatoriedade de publicação metodológica.
6. Responsabilização e Transparência das Plataformas Digitais:
a) Obrigação legal de que as plataformas com mais de 500.000 utilizadores em Portugal publiquem relatórios trimestrais com: Estatísticas de remoção de conteúdos falsos; Parcerias com fact-checkers e Estratégias de mitigação de riscos em português.
7. Financiamento e Supervisão:
a) As medidas propostas podem ser parcialmente cofinanciadas por fundos europeus (nomeadamente do Programa Europa Digital e do Citizens, Equality, Rights and Values).
b) A Assembleia da República deve promover audições regulares com as plataformas tecnológicas, fact-checkers e investigadores sobre o cumprimento deste regime.
Conclusão
A desinformação, sendo uma ameaça estrutural à democracia, exige uma resposta articulada, moderna e proporcional. Esta proposta visa dotar o Estado português dos instrumentos necessários para proteger os cidadãos, reforçar a confiança democrática e garantir a integridade do espaço público digital.

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